sexta-feira, 27 de maio de 2011

Alvorada - da Ópera Lo Schiavo, de Antônio Carlos Gomes

VEJA, 20 de novembro de 1889


O maestro brasileiro Carlos Gomes, de 53 anos, nome estabelecido entre as platéias operísticas européias como um dos bons compositores do gênero, vestiu o cocar de penas coloridas e cedeu à tentação do sucesso fácil. Sua nova criação, Lo Schiavo (O Escravo), que estreou em setembro no Rio de Janeiro, passa perto de se tomar uma grotesca paródia, a despeito da ótima música que Carlos Gomes escreveu. O compositor, mais de um ano depois da Abolição da Escravatura no Brasil, não teve coragem para colocar um negro como personagem principal, caindo no ridículo de fazer com que um índio - o corajoso lbere - protagonizasse sua nova ópera. A manobra teve evidentes intenções comerciais, pois Carlos Gomes seguiu o conselho de seus empresários na Itália, que tencionavam repetir o sucesso de O Guarany, estouro de bilheteria desde sua estréia, em 1870. No raciocínio dos empresários, o público se encantou com o índio Peri, e portanto valia repetir a dose - desta vez com o exotismo inconcebível de colocar um indígena, e não um negro, como escravo. Comenta-se que a colocação do índio no lugar do negro desagradou profundamente ao autor do argumento da peça, Alfredo d'Escragnolle Taunay.
O erro de Carlos Gomes é tanto mais lastimável quando se leva em conta que em Lo Schiavo ele fez uma de suas melhores óperas até hoje, superando, em qualidade e invenção, seu maior sucesso, O Guarany. Desta, Carlos Gomes manteve as melodias inspiradas, juntando a elas uma boa dose de ousadia orquestral e harmônica que já havia ensaiado em Fosca. O prelúdio do 4º ato, chamado Alvorada, tem tudo para se tomar peça do repertório das salas de concerto por seu poder de sugestão e riqueza do colorido orquestral. Pena que o brilho da música é empanado pelo grotesco de se ver, em cena, tenores seminus interpretando índios com inverossímeis bigodões, cantando em italiano, a exemplo do que já acontecera em O Guarany. Índio no lugar de negro escravo já é difícil de acreditar - e índio de bigode é impossível.
Talvez o compositor campineiro tenha sucumbido a algo mais grave que a vontade dos empresários italianos em lotar teatros: o preconceito racial. Se colocasse um personagem negro, não estaria sequer sendo o primeiro a fazê-lo. É bom lembrar que o protagonista de Otello, de Verdi, estreada há dois anos, é um mouro, e a personagem principal de Aida é uma princesa etíope. Lo Schiavo marca um dos períodos mais atribulados da carreira de Carlos Gomes. A ópera estrearia, a princípio, não no Rio de Janeiro, mas em Bolonha, na Itália, país onde o compositor reside há mais de vinte anos. As récitas italianas foram suspensas por uma decisão judicial. Para compor o belíssimo Hino à Liberdade, incluído no 2º ato da ópera, o compositor valeu-se de um poema do vate italiano Francesco Giganti, um amigo seu. Rodolfo Paravicini, autor do Iibreto original sobre o argumento de Taunay, não gostou que se fizessem enxertos na sua obra literária e entrou na Justiça - ganhou a causa, impedindo que os índios de Carlos Gomes entoassem seus cantos no país de Verdi.
Com o revés italiano, CarIos Gomes veio de malas e bagagens para o Brasil, confiando que seria possível montar a ópera aqui, com a ajuda do imperador, habitual financiador dos seus projetos. O Visconde de Taunay, amigo de Carlos Gomes há anos, foi ter com o imperador para relatar as dificuldades do compositor, que, com graves problemas financeiros, não teria como montar sua ópera. D. Pedro II entusiasmou-se com a possibilidade de estrear Lo Schiavo no Brasil. Quando soube, porém, que as despesas com a montagem poderiam chegar aos 40 contos de réis, deu um pulo do trono. "Ui, que isto também é demais", disse D. Pedro II a Taunay. A ópera só pôde ser estreada no Rio de Janeiro graças à Princesa Isabel, que abriu uma subscrição para arrecadar fundos com a nobreza e o empresariado locais.
Com o sucesso de Lo Schiavo no Rio de Janeiro, Carlos Gomes obteve a promessa do imperador D. Pedro II de que seria nomeado diretor do Conservatório Nacional de Música. A promessa dificilmente irá se concretizar com a instauração da República, já que Carlos Gomes é um nome tradicionalmente ligado ao imperador e ao antigo regime. Caso não consiga o emprego, o compositor, que tencionava voltar ao Brasil, ficará em situação difícil, já que atravessa graves problemas financeiros na Itália - foi obrigado a abandonar a suntuosa vila onde morava para se mudar para um apartamento modesto em Milão. Espera-se que Carlos Gomes consiga sanear suas finanças com os rendimentos de Lo Schiavo continue escrevendo belas óperas - tomando cuidado, da próxima vez, em enfrentar as questões de seu tempo.


"Alvorada", música brasileira no alvorecer do séc.XX de CARLOS GOMES, abertura da ópera LO SCHIAVO (O ESCRAVO), baseada numa história do Visconde de Taunay, com libreto de Rodolfo Paravicini.
A ópera estreou no Rio de Janeiro em 1889, um ano após a abolição da escravatura e às vésperas da proclamação da república.
Nesta ópera destaca-se a ALVORADA da ópera, uma das composições mais elaboradas de CARLOS GOMES na qual, descreve um amanhecer.
Podemos ouvir os primeiros cantos dos pássaros e sentir, através da música, o paulatino nascer do dia até a explosão final com a chegada do sol.
A obra começa com poucos instrumentos, outros vão se agregando num crescendo que termina em fortíssimo com a orquestra completa.
Há muita profundidade nessa música. LO SCHIAVO é um canto de liberdade.__________________________________________________________________________________

 

Gravado ao vivo na Sala Simón Bolívar em 30/01/2011
Sinfónica de la Juventud Venezolana "Simón Bolívar"
Regente: ROBERTO TIBIRIÇÁ



Busto de Carlos Gomes em frente ao Auditório Araújo Viana em Porto Alegre.


Alvorada: Na minha opinião um trecho muito bonito.
Não é nada difícil imaginar um amanhecer em um campo aberto, em um lugar bonito... É uma música cuja melodia é rodeada por uma enorme esperança...do pianíssimo ao fortíssimo ela faz com que nos sintamos vivos,altos e mais que tudo: seres humanos.Cada um com suas esperanças e subjetividades no coração,apreciando o amanhecer de um novo dia na natureza,coração e na alma de cada indivíduo! Assistam! Vale a pena!!!
Mateus Dossin





EM TRÊS ARCO-IRIS: UMA COLONIA DE LUZ - Por EURIPEDES KUHL:

 " Mas,ao acordar,percebeu que a janela do quarto estava aberta e que a claridade solar invadia radiosa todo o ambiente,além de ouvir a grandiosa música ALVORADA,da ópera "Lo Schiavo" ,de Carlos Gomes.Isso lhe transmitiu aagradável sensação de ter passado uma noite de sono pacífico,conquanto sem lembrança de sonhos."